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quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Sócrates e a doutrina do Voluntarismo "Poder é direito"




Rm 9:13 -  Como está escrito: Amei a Jacó, e aborreci a Esaú.
 Essa citação se baseia no trecho de Ml 1:2,3. Os intérpretes se têm esforçado extraordinariamente para enfraquecer o senso de «ódio» que aqui transparece, suavizando-o para «amor menor», ou alguma outra modificação qualquer. Qualquer pessoa que lê o contexto do segundo capítulo da profecia de Malaquias, entretanto, percebe claramente que as palavras «amar» e «aborrecer» devem ser entendidas em seu sentido literal. O trecho de Ml 1:4 fala dos edomitas como «Povo contra quem o Senhor está irado para sempre».

Na exegese ou interpretação, é necessário manter a honestidade a qualquer custo, em que, antes de tudo, se deve determinar o sentido exato de qualquer passagem bíblica dada. Somente quando um sentido é inaceitável é que o intérprete tem o direito de aliviar os elementos inaceitáveis, para que a interpretação resultante se coadune com o resto dos ensinamentos bíblicos, para que tal interpretação possa ser aceita pela consciência humana. Assim é que, nessa passagem de Malaquias, citada por Paulo neste versículo, não pode estar em vista qualquer outra coisa além do ódio literal, em que o Senhor aparece irado contra certo povo «...para sempre».

Realmente, isso parece ser contrário a tudo quanto sabemos sobre Deus, porque parece negar sua misericórdia e seu amor, como algo diametralmente contrário à mensagem do trecho de Jo 3:16. Portanto, na interpretação deste versículo, que oracomentamos, que se pode dizer? Não é honesto tentarmos reduzir o seu sentido a termos como, por exemplo, «amor menor», com a finalidade de aliviar certas passagens do A.T. de sua suposta excessiva severidade, supondo-se que Paulo usou os seus termos do mesmo modo que o fazia o A.T., como também não seria honesto aliviar certas ideias de Paulo de sua suposta excessiva severidade. É muito melhor afirmarmos que os homens, incluindo até mesmo homens bons e piedosos, nem sempre se mostraram coerentes e corretos em suas afirmativas sobre a natureza de Deus; antes, em determinadas ocasiões, tais homens têm injetado seus próprios sentimentos em suas declarações acerca da personalidade divina.

Desse modo, a nação de Israel odiava a nação de Edom, e os israelitas esperavam que seu ódio jamais se abrandasse. Portanto, os israelitas chegaram à suposição de que Deus compartilhava totalmente dos seus sentimentos.

VOLUNTARISMO

O «voluntarismo». Trata-se da noção filosófico-teológica de que a vontade de Deus é suprema, pois Deus agiria principalmente de acordo com a sua «vontade», e não de acordo com sua «razão». Isso significaria, por sua vez, que tudo aquilo que Deus determina por sua vontade é correto, sem importar o que o homem possa pensar sobre a moralidade dos atos divinos. Foi Sócrates quem ventilou a questão crucial, quando perguntou: «Uma coisa é direita porque Deus a determina pela sua vontade, ou Deus determina alguma coisa porque ela é direita?». E a noção do «voluntarismo» retruca: «Algo é direito porque assim Deus determina pela sua vontade». Portanto, se porventura Deus envia alguns homens para matarem e fazerem violência contra outros (conforme algumas passagens do A.T. pintam ao Senhor), isso se torna automaticamente correto, ainda que outras passagens bíblicas indiquem que matar é um pecado. Em outras palavras, segundo essa posição do«voluntarismo», Deus pode fazer aquilo que o próprio Deus disse ao homem ser imoral como prática humana, somente porque o homem tem a capacidade de praticar isto ou aquilo. Foi com base nesse pensamento que se criou a proposição que diz que «Poder é direito». Porém, precisamos confiar em Deus de que ele faz todas as coisas segundo a razão e a justiça, e não meramente de forma caprichosa e arbitrária. Outrossim, precisamos crer que Deus não pratica aquilo que ele mesmo proibiu aos homens fazerem. Por conseguinte, o ponto de vista do «voluntarismo», acerca da personalidade de Deus, dentro ou fora das Escrituras, sob qualquer forma que esse ponto de vista assume, é errôneo, e deve ser peremptoriamente rejeitado.

Considerações Sobre O Voluntarismo

1. O voluntarismo é o âmago mesmo da reprovação ativa, pois, mediante esse fator é que Deus endurece, condena e julga, devido à sua própria vontade soberana, inteiramente à parte do que o homem tenha sido, seja ou possa vir a ser.

2. Não podemos ignorar a mensagem do nono capítulo de Romanos, supondo que se relacione somente a juízos temporais, à eleição de nações, e não de indivíduos, ou que estejam envolvidos apenas princípios religiosos, e não individuais.

3. Se asseverarmos que existem «razões» por detrás da «vontade» divina, então já teremos abandonado a ideia do verdadeirovoluntarismo, o que dá a ideia de mera ação da vontade, levada pelo capricho. Isso será uma verdade, mesmo que cheguemos a supor que as razões são divinas, completamente ocultas da inteligência e da pesquisa humanas. A maioria dos teólogos supõe a existência de motivos, divinos ou humanos, ou mesmo ambos, pelo que não são verdadeiros seguidores da ideia dovoluntarismo.

4. O voluntarismo se relaciona com a «reprovação». Veja sobre esse tema, em Rm 9:10.

5. O trecho de Rm 9:30—10:21, ensina-nos que a vontade e o agir humano entram em cena na questão da salvação, pelo que qualquer forma de voluntarismo é abandonada. Se destacarmos no nono capítulo desta epístola, porém, não poderemos afirmar tal coisa. Será isso, igualmente, um paradoxo? O voluntarismo é uma verdade, por um prisma divino; porém, não é a única verdade, posto existirem considerações humanas. Mas é verdade, seja como for, que estamos manuseando aqui com elevadas doutrinas e profundas realidades espirituais que são essencialmente misteriosas para nós, no presente; e que essa é uma das chaves da interpretação dessas questões complicadas.

«De nada nos vale tentar suavizar essas expressões bíblicas. Malaquias tencionou que elas fossem compreendidas bem literalmente... e elas foram literalmente aceitas pelo apóstolo Paulo. (Porém, não nos devemos olvidar, como também ficará bem claro mais adiante, que Paulo falava, pelo menos até certo ponto, hipoteticamente). O ato divino da seleção de Jacó, pois, foi um ato de pura graça, não estando condicionado aos méritos de Jacó e nem ao fracasso moral de Esaú. Paulo, portanto, poderia ter concluído, como parte de seu argumento, o seguinte: 'Agora, o que impediria Deus de tomar uma decisão posterior, sobre quem pertenceria a Israel que haveria de receber o cumprimento de suas promessas? De fato (conforme ele diz em Rm 4:16), os beneficiários dessa promessa não precisavam ser judeus, sob hipótese alguma'. Em outras palavras, o pacto de Deus com Israel não poderia ser considerado invalidado, mesmo que todos os judeus rejeitassem o evangelho e perdessem o cumprimento da promessa, porque 'Israel' significa não os judeus, por descendência natural, e, sim, os eleitos, sem importar a nação de que vieram». (John Knoxin loc).

«A atitude profana de Esaú foi o motivo paralelo, mas não a causa da seleção divina de Jacó. A razão dessa escolha só pode ser encontrada no profundo do coração de Deus, aquele mundo 'escuro de tanta luz'. Tudo está bem ali, mas nós não conhecemos tudo quanto existe ali.

Assim somos elevados até à porta fechada do santuário da escolha divina. Toquemos nela; ela é adamantina, e estáhermeticamente trancada. Ne­nhum tirano inacessível está assentado em seu interior, brincando com ambos os lados de um jogo da sorte, indiferente aos clamores das almas humanas. O portador da chave, cujo Nome está gravado na porta, é: '...e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos, e tenho as chaves dá morte e do inferno' (Ap 1:18). E se porventura apurarmos os ouvidos, haveremos de ouvir palavras no íntimo semelhantes à suave e profunda voz de muitas águas, mas que procedem do coração eterno: 'Sou o que sou; quero o que quero; confiai em mim'. Não obstante, a porta está trancada, e a voz é misteriosa». (Moulein loc., que salienta aqui um elemento necessário para a nossa interpretação sobre toda esta passagem. Pois as questões relativas à predestinação e à eleição não podem ser explicadas por qualquer raciocínio humano, embora tenhamos algo de significativo para dizer).

Não nos devemos esquecer do ponto principal de toda essa discussão, que retrocede até ao versículo seis deste capítulo e da proposição ali proferida. O propósito de Deus não falhou, embora a maioria da população israelita tenha rejeitado o Messias, já que o acolhimento ao Messias dependia da eleição da graça. Paulo não ventila o outro lado do paradoxo, isto é, qual o papel desempenhado pelo homem. Esta ideia sé evidencia, entretanto, em outras passagens das Escrituras.

«...como está escrito...» Com essas palavras, Paulo introduz os seus principais argumentos neste texto, com a intenção de mostrar que a sua teologia não era criação sua, mas antes, era aquela que concordava perfeitamente com os ensinamentos do A.T. Os versículos sétimo e nono apresentam essa harmonia entre Paulo e o A.T., por meio de citações, sem a fórmula, «está escrito». Essa frase ocorre por dezessete vezes na epístola aos Romanos, assim vinculando as importantes porções da mensagem dessa epístola a ideias já existentes no A.T. Por conseguinte, Paulo defendia o tema da continuação da revelação do Antigo no Novo Testamento. Isso, demonstra que Jesus era o Messias prometido no A.T., porque o N.T. foi escrito para descrever o sentido e a importância de Cristo para os homens. (Quanto à apologia cristã primitiva, que tinha por desígnio demonstrar essa verdade, ver Jo 7:45. Quanto aos diversos trechos onde essa expressão «está escrito», ocorre nesta epístola aos Romanos, ver as seguintes referências: Rm 1:17; 2:24; 3:4,10; 4:17,23; 8:36; 9:13,33; 10:15; 11:8,36; 12:19; 14:11; 15:3,9,21. O trecho de Rm 15:4 contém a mesma ideia, apesar de não estar vazada exatamente nas mesmas palavras; em vários lugares, são citados trechos do A.T., sem a fórmula específica «está escrito», conforme se verifica nos versículos sétimo e nono deste capítulo).